Na medida que as crianças vão crescendo começam a atingir maturidade e explorar o seu espaço para conhece-lo. O seu desenvolvimento está relacionado ao aumento da sua autonomia e o processo de socialização, assim a alimentação, que até então era a principal fonte de prazer, passa a um plano secundário.
Algumas crianças tem o comportamento alimentar seletivo, crianças com esta característica, apresentam um consumo limitado de alimentos e isso não quer dizer que estão doentes. A dieta dos seletivos é baseada em carboidratos e produtos lácteos. É comum observar que, muitas destas crianças só aceitam a alimentação se esta tiver uma determinada técnica de preparo e apresentação ou comem só em um tipo de prato sem misturar as preparações bem como consumir apenas uma determinada marca, mediante o reconhecimento do rótulo.
Foi realizado um estudo na Universidade do Tennesse, com crianças de 24 a 36 meses, de níveis socioeconômicos distintos, com o propósito de verificar a hipótese de que crianças seletivas possuíam consumo alimentar menor do que as não seletivas . Este estudo demonstrou que ambos os grupos apresentaram inadequação quanto ao consumo de cálcio, zinco, vitaminas D e E. Com relação à ingestão energética média, constatou-se que não houve diferença significativa; 1472 Kcal para não seletivos e 1468 Kcal para seletivos. Outro achado interessante neste estudo refere-se ao comparativo de peso e estatura, visto que não houve diferenças nos parâmetros de crescimento. Todos se encontravam mantendo velocidade de crescimento adequado, apesar das mães das crianças seletivas acharem que seus filhos tinham algum comprometimento da saúde.
Em virtude disto, é preciso distinguir as crianças que comem pouco e/ou são seletivas daquelas que realmente apresentam critérios diagnósticos da anorexia. Alguns dos mecanismos que participam do desenvolvimento deste quadro são: dor crônica, depressão, ansiedade, hipogeusia (sensibilidade diminuída do paladar), hiposmia (diminuição do olfato), náuseas, saciedade precoce e funcionamento inadequado do trato gastrointestinal. Enquanto a seletividade não pode ser classificada como uma desordem alimentar clássica e sim como uma manifestação de protesto e oposição da criança aos pais.
Outro fator relevante é a organização da rotina da criança, a influencia do horário escolar pode em determinadas situações, prejudicar a aceitação das refeições. Estudos sobre o horário e o tempo de duração das refeições revelam que 33% das crianças não estão com fome no momento da refeição. No caso das crianças seletivas, este índice é de 52%. Com relação à durabilidade desta, os seletivos demoram mais para se alimentar sendo em torno de 23,3 minutos do que os não seletivos que levam 19,7 minutos.
O conflito de pais e filhos inicia quando a criança deseja algo e seus pais são quem determinam a quantidade e a qualidade dos alimentos a serem consumidos. Parece que tanto a mãe como o filho elegem o momento da refeição como a hora ideal para mostrar seus conflitos, angustias e dificuldades, instalando um ciclo vicioso, onde a criança tenta exercer com seu comportamento, um tipo de domínio sobre a situação e a família. Estudos apontam que muitos dos problemas alimentares não dizem respeito ao ato de alimentar em si, mas são decorrentes de conflitos oriundos de relações intra familiares.
Existem evidências de que as crianças são capazes de ajustar a ingestão de alimentos. O clássico estudo de Clara Davis, realizado em 1930, tinha a seguinte proposta: as crianças “sabem” o quanto precisam comer? Esta foi uma pergunta que Davis tentou responder com os estudos sobre auto-seleção alimentar, realizada com crianças entre 2 e 5 anos de idade, na ausência da intervenção adulta. Esta pesquisa pioneira leva-nos a sugerir que as crianças possuem uma capacidade inata de regular o consumo alimentar e conseqüentemente são capazes de manter o crescimento e a saúde.
A crença dos pais de que as crianças são incapazes de regular sua ingestão alimentar, estimula a preocupação, a ansiedade e a intervenção dos mesmos, que recorrem ao emprego de estratégias coercitivas e controladas na alimentação da criança. Desta maneira, é válido ressaltar aos responsáveis que, as crianças nascem com instinto de sobrevivência / preservação. Ou seja, a criança se alimenta impulsionada por dois estímulos: a necessidade do organismo e a sensação de fome.
Como a maioria dos problemas alimentares não se limita apenas a criança, mas trata-se de um problema familiar, a avaliação e o tratamento da queixa a criança que não come deve ser realizada por uma equipe multidisciplinar. A intervenção visa tranqüilizar os pais, sanando dúvidas e diminuindo a ansiedade; e promover a modificação no comportamento alimentar da criança, tornando o momento da refeição, natural, descontraído e prazeroso para todos.